Lembrei-me acidentalmente daquele programinha chamado "Segundos Fatais", que passa às segundas no canal National Geographic, enquanto pensava em uma maneira legal de escrever de maneira resumida como um evento simples, na qual infelizmente tive o desprazer de estar, pode ir por água abaixo em efeito bola de neve. Por isso, segue toda cronologia da tragédia, do início ao fim.
I Festa do Boi no Rolete - Igreja Nossa Senhora de Fátima
motivo da festa: arrecadar fundos para reforma da Igreja (não estava caindo aos pedaços, mas precisava de um trato)
organização: Colaboradores amadores voluntários
preço: R$17,00 e crianças até dez anos não pagava (e olha que tinha cada criança de dois metros de altura viu)
dia/horário: domingo, mês de junho, das 10h00 até 17h00.
A CRONOLOGIA DO DESASTRE
9h30: Início de missa inaugural do evento na Igreja, que fica do lado do colégio onde seria realizado o evento ( hoje Colégio Franciscano João XXIII, bairro do Ferreira, pertinho da Vila Sônia)
10h00: Horário de início da festa (parece ridículo, mas a festa começou antes de terminar a missa inaugural hahahaha)
11h00: Pessoal que vem da missa chega no colégio e constata que já existe uma multidão de mortos de fome comendo (acho que teve gente que não comia fazia uma semana naquele lugar)
11h20: Esse mané que vos fala chega todo animado na festa e vai ver como são assados os benditos bois.
11h25: Levo um susto ao ver que o primeiro boi já tinha sido totamente devorado e o segundo já estava quase pela metade (a carne ficou só no aperitivo).
11h35: Percebo que explodiram com as vendas dos 1500 ingressos previstos (tinha pelo menos mil pessoas a mais)
11h40: Milagrosamente encontro um dos poucos lugares à sombra restantes, já que a quadra coberta não tinha espaço para nem mais um mosquito.
11h45: Vou desfrutar do farto buffet - arroz frio, mandioca cozida no dia anterior parecendo um pau de dura, salada sem tempero (espero que tenham lavado pelo menos a alface) e farofinha 97,5% farinha de milho.
11h50: Depois de uma longa batalha, consigo pegar um pouco de carne.
12h00: Tento repetir o prato, já que percebi que passaria fome. Outra guerra. Estratégias começam a ser elaboradas e as pessoas começam a lutar arduamente em grupo pela carne nos tachos.
12h10: Volto para tentar o que seria meu último pedacinho de carne, consigo, mas depois de ter meu mindinho esmagado por uma tia xarope com uma colher de pau (até hoje não sei onde ela achou aquilo)
12h11: Vejo que tem muita gente chegando, fora a galera que já estava lá dentro.
12h30: Pelo menos 500 pessoas se acumulam no pátio do colégio em busca de carne, com fome, desesperadas. Pessoal da empresa responsável por assar a carne literalmente são saqueados no caminho.
12h45: Quase mil pessoas já se acumulam no patio atrás de carne. O espaço ficou parecendo trem da CPTM de gente. Histórias e cenas hilárias se acumulam. O cara da empresa atacado deixou cair o cesto de carne no chão e as pessoas continuam pegando tudo que caiu, um mané rouba o cesto de carne e sai correndo pra mesa, as velhinhas que começaram a se estranhar pq uma pegou o filezinho da outra... Desespero bem parecido com o do filme "Guerra dos Mundos"...
12h50: Pessoas começam a ir no estacionamento para ver se conseguem carne. Ao verem que a carne acabou, começam a catar todos os ossos possíveis que possam ter um pouquinho de carne.
13h10: Não sobra nenhum osso dos bois pra contar história. Pessoal continua acumulado esperando carne no pátio. Alguém pode chamar a ONU pra ajudar esses famintos?
13h15: Famintos em busca de carne são barrados na porta do estacionamento, que é fechado. Responsável pelo evento começa a pedir calma, para que todos retornem às suas mesas e que o problema era o pessoal da empresa que estava com dificuldades de repor a carne (mentira deslavada).
13h30: Com toda festa revoltada porque já sabiam que a carne acabou, responsável solta a seguinte pérola "Calma pessoal, a festa vai até 5 da tarde. O boi fugiu mas já volta" (sem brincadeira, o cara me falou isso mesmo). Pessoal cogita colocá-lo pra assar, mas como o cara é magro e alto ao bom estilo "mapa do Chile", não valeria a pena.
13h45: Outras barraquinhas começam a ser atacadas. Os preços triplicam do nada, mesmo assim as pessas continuam comprando.
14h00: Acabam as sobremesas, o sorvete, a pipoca e o algodão doce. Restam as mexericas.
14h20: Putis, acabou a mexerica... Vamos tentar ganhar uma bola então? Putis, acabaram as prendas também...
14h25: Em se tratando de festa beneficente, as portas são abertas aos mendigos da região, que invadem o local para uma boca livre. Pessoal adora a filantropia!!!
14h28: Mendigos ficam desgostosos com o buffet, ou melhor "bufete". Sem estômago para mandioca fria e já azulada, e com fome, começam a ir embora.
14h30: Responsável comunica "Pessoal, o boi voltou". hahahaha. Não sei onde arranjaram umas linguiças, uns espetinhos e umas carnes de terceira para assar. Racionaram cada sebinho entre o pessoal. Não sobrou nem pro cachorro.
14h35: Uma fila indiana de famintos se forma a espera de um pouco de carne. Detalhe, como acabaram os pratos, restaram os pães murchos. Como acabaram os talheres plásticos, restaram os palitos de dente e os dedos.
15h00: Consigo mais um pouco de carne finalmente. Detalhe: a mulher que estava na minha frente era conhecida do garçom e encheu o pão de carne. Eu fiquei atrás e recebi só dois fiapos gordurentos. Reclamei, o cara me pôs mais um fiapo queimado e disse que eu era egoísta e que tinha que deixar mais carne pros outros (haja fartura).
15h01: Pensei em mandar o cara ir tomar naquele lugar, mas minha fome superou tal pensamento. Pena que a carne não deu nem pra dar sabor na língua.
15h15: Começa a esfriar o tempo e as pessoas vão embora. Resolvo ficar e ver o que sai daquele evento. Será que vai ter briga? Será que vem mais carne? Será que devolvem meu $$$$?
15h30: Acaba a carne de vez e o carvão. Responsáveis comunicam "Terra Arrasada"... Sumam daqui pessoas. Pelo menos vinte voluntários começam a fechar as mesas, jogar as coisas no lxo, fechar cadeiras em mesas com gente. Não dizem nada, mas ao mesmo tempo dizem tudo...
15h45: Praticamente tudo da festa está desmontado. Mas não teríamos mais de uma hora de festa?
15h50: Antes que soltem os cachorros, resolvo, extremamente insatisfeito, ir embora.
OBS: Não quero criticar ninguém, mas apenas mostrar como um evento pode entrar em colapso se mal organizado. Às vezes, se aprende mais com os erros que com os acertos não é verdade. Se tivessem vendido os convites na quantidade certa, a festa teria sido um sucesso (dentro dos objetivos), mas não foi. Não se pode pensar apenas no lucro, mas também em satisfazer o pessoal. Fizeram anúncios, faixas, cartazes... Tudo pra quê? Felizmente não teve briga por ser um público mais consciente e pela festa ser beneficente. Quanto a mim, fiquei no prejuízo total e ainda tive que chegar em casa para tomar um bom café da tarde.
Postado por Pedro
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